VIDA DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS–Parte II

Sem aspirações sobrenaturais, voltadas para o Reino Celeste, Deus então intervém e "molda" São Francisco, levando-o ao caminho da santidade...

Nesta época da sua vida, ao contrário do que se poderia imaginar, o jovem Francisco não se deixava absorver inteiramente pela agitação da vida social.
Embora notavelmente dotado para a ação, guardava ciosamente no fundo do coração um recanto de mistério e de sonho. Tinha uma alma de artista, extremamente sensível às belezas da natureza.
Quem não ouviu falar das paisagens esplendorosas da Úmbria?
A vegetação mediterrânica cresce ali num quadro de extraordinária frescura; os ciprestes destacam-se sobre a vegetação rasteira; as oliveiras cortam com suas manchas cinzentas os verdes prados irrigados.
Os sítios pitorescos abundam. Acima de tudo, uma luz límpida e refulgente confere àqueles vastos panoramas uma nitidez incomparável.
Francisco gostava de passear sozinho pelas colinas que envolvem a sua cidade natal. Contemplava demoradamente o espetáculo deslumbrante que se descortinava sob seus olhos e que o enchia de enlevo.
No seio desta existência brilhante, mas vã, como se achava a alma do nosso herói?
O Santo permaneceu puro; os seus primeiros biógrafos declaram-no expressamente. Cristo preservou de qualquer mancha esta carne, onde queria imprimir um dia os sagrados estigmas da Paixão.
Francisco mostrava-se caritativo; dava esmolas com liberalidade, não por ostentação, mas por espírito de fé. Contudo, um dia despediu com certa dureza um mendigo que perturbara o seu trabalho.
Não tardou em lamentar amargamente este movimento espontâneo de indelicadeza. Ao afastar aquele pobre, não teria – perguntava-se – sido descortês com um embaixador do Altíssimo?
Assim era então o jovem cuja virtude deveria brilhar mais tarde com tão vivo fulgor. Feliz com os êxitos mundanos, não tinha grandes ambições sobrenaturais.
Mas o Senhor intervém. Como o artista que esculpe um mármore raro, Deus modela esta rica natureza e, sob a ação da sua graça, faz aparecer o santo.
Uma doença grave
Francisco tinha vinte e quatro anos quando uma doença grave o prostrou  no leito. Chegou-se a temer um desenlace fatal. O perigo foi grande, os sofrimentos pungentes e a convalescença demorada.
O pobre doente não se dava bem com a monotonia e a inação: tinha pressa em retomar o contato com a vida diária. Quando conseguiu levantar-se apoiado num bordão, percorreu as diferentes divisões da casa paterna.
Olhava ansiosamente pelas janelas a luz vinda de fora, que tão bonitos reflexos despedia. Desejava com impaciência passear ao ar livre e contemplar novamente os horizontes que lhe eram familiares.
Por fim, saiu pela primeira vez. O sol brilhava; o vale de Assis revestia-se com as suas belezas costumeiras. Francisco antes tão propenso a entusiasmar-se com o espetáculo da natureza, permaneceu indiferente.
Uma indefinível tristeza penetrava na sua alma em profundidades que ele nunca imaginara. Sentia cavar-se em si um vazio de tal modo imenso, que somente o infinito podia preencher.
Compreendia, experimentava, com uma espécie de intuição fulminante, que os seus sonhos passados eram um nada irrisório.
Retomou devagar e cabisbaixo o caminho de casa; do seu coração subia silenciosamente, mas com uma intensidade lancinante, o grito desiludido do Eclesiastes: “Vaidade das vaidades! Tudo é vaidade!”.
Era o primeiro chamamento da graça: ela dissipara a imagem que tinha fascinado a sua juventude; desprendia-o, assim, das criaturas para que a sua alma pudesse em breve apaixonar-se pela Beleza divina.

Fonte: retirado do livro “São Francisco de Assis” do Rev. Pe. Thomas de Saint-Laurent.

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