MAIO COM MARIA: Dia 24 - Particular clemência de Maria para com os pecadores
“Consentis, Senhor, que façamos descer fogo do céu
e os consuma?” — assim perguntaram ao Mestre João e Tiago, quando os samaritanos
se recusaram a receber Jesus Cristo e sua doutrina. Respondeu-lhes então o
Salvador: Não sabeis de que espírito sois? (Lc 9, 55). Queria dizer: Sou de um
espírito todo de clemência e doçura; para salvar e não para castigar os
pecadores, vim do céu e vós quereis vê-los perdidos? Falais em fogo e castigo?
Calai-vos e nisso não me faleis mais, porque não é esse meu espírito! Ora, sendo
o espírito de Maria completamente semelhante ao de seu Filho, não podemos pôr em
dúvida seu natural compassivo. De fato, é chamada Mãe de Misericórdia e foi a
própria misericórdia de Deus que tão compassiva e clemente a fez para todos.
Assim o revelou a própria Virgem a S. Brígida. Por isso representa-a S. João
revestida do sol: Apareceu um grande sinal no céu; uma mulher vestida do sol (Ap
12, 1). Comentando o trecho, diz S. Bernardo à Virgem: Senhora, revestistes o
Sol (Verbo Divino) da carne humana, mas ele vos revestiu também de seu poder e
de sua misericórdia.
Nossa Rainha — continua o Santo — é sumamente
compassiva e benigna; quando algum pecador se encomenda à sua misericórdia, ela
não se põe a examinar-lhe os méritos, para ver se é digno de ser ouvido ou não,
mas a todos atende e socorre. Eis a razão, conforme observa Hildeberto, por que
de Maria se diz que é bela como a lua (Ct 6, 9). Assim como a lua ilumina e
beneficia os objetos mais inferiores sobre a terra, também ilumina Maria e
socorre os pecadores mais indignos. Embora a lua receba do sol toda a sua luz,
leva menos tempo que ele para descrever seu curso. É-lhe suficiente um mês, ao
passo que o sol gasta um ano a perfazer o seu giro. Isso motiva então as
palavras de Eádmero ao afirmar que nossa salvação será mais rápida, se chamarmos
por Maria, do que se chamarmos por Jesus. Pelo que Hugo de S. Vítor nos
adverte que se os nossos pecados nos fazem ter medo de nos chegarmos para Deus,
cuja Majestade infinita ultrajamos não devemos recear de recorrer a Maria; pois
nada nela existe que inspire terror. É verdade que é santa, Imaculada, Rainha do
mundo e Mãe de Deus. Mas é uma criatura e filha de Adão, como nós.
Em suma, conclui S. Bernardo, tudo o que
pertence a Maria é cheio de graça e de piedade, porque, como Mãe de
misericórdia, se fez tudo para todos; por sua imensa caridade tornou-se devedora
dos justos e dos pecadores; para todos está aberto seu coração, para que possam
receber de sua misericórdia. Se por um lado está o demônio sempre procurando
a quem dar a morte, como no-lo atesta S. Pedro (l Pd 5, 8), de outro lado está
buscando Maria almas a quem possa dar a vida e salvar, segundo afirma Bernardino
de Busti.
Devemos, pois, saber que a eficácia e a expansão
do patrocínio de Maria vão além das nossas noções, diz S. Germano. Por que,
outrora, tão grande era o rigor de Deus para com os pecadores, quando agora, na
Lei Nova, usa de tanta misericórdia com eles? Fá-lo por amor de Maria e em vista
de seus merecimentos. Assim pergunta e assim responde Pelbarto. Há muito
tempo teria já cessado de existir o mundo, assevera Fábio Fulgêncio, se não o
tivesse Maria sustentado com suas preces. Podemos, entretanto, ir
seguramente a Deus e dele esperar todos os bens, diz Arnoldo de Chartres, agora
que temos o Filho como nosso medianeiro, junto ao Pai, e a Mãe como nossa
medianeira junto ao Filho. Como poderia o Pai deixar desatendido ao Filho,
quando este lhe mostra as chagas recebidas por amor aos pecadores? E como
poderia o Filho desatender à Mãe, mostrando-lhe esta os seios que o
sustentaram? Enérgicas e belas são as palavras de S. Pedro Crisólogo: A
excelsa Virgem hospedou a Deus em seu ventre; em paga de tal hospitalidade dele
exige a paz para o mundo, a salvação para os perdidos, a vida para os
mortos.
Oh! exclama o Abade de Ceies, quantos que, dignos
do inferno segundo a justiça divina, são salvos pela compaixão de Maria! Sim,
porque ela é o tesouro de Deus, e a tesoureira de todas as graças; em suas mãos
está por isso a nossa salvação. Por conseguinte recorramos sempre a essa grande
Mãe de Misericórdia, firmes na esperança de nos salvarmos por sua intercessão.
Pois não lhe chama Bernardino de Busti nossa salvação, nossa vida, nossa
esperança, nosso conselho, nosso refúgio e nosso auxílio? Realmente, diz S.
Antonino, é Maria aquele trono de graça ao qual nos cumpre confiadamente
recorrer para obter a divina misericórdia e todos os auxílios que nos são
necessários, conforme a exortação de S. Paulo: “Marchemos, pois, cheios de
confiança para o trono de graça, a fim de obtermos misericórdia e alcançarmos a
graça no socorro oportuno” (Hb 4, 16). Pelo que S. Catarina de Sena chamava a
Maria de distribuidora da divina misericórdia.
Concluamos por conseguinte com a elegante e terna
exclamação de S. Boaventura: Ó clemente, ó piedosa, ó doce Virgem Maria!
Ó Maria, sois clemente para com os miseráveis, compassiva para com os que vos
invocam, doce para com os que vos amam; sois clemente para com os penitentes,
compassiva para com os justos, doce para com os perfeitos. Mostrai vossa
clemência, em nos livrando dos castigos; vossa piedade, em nos dispensando as
graças; vossa doçura, em nos dando a quem vos procura.
Exemplo
Na vida do Padre Antônio Colleli lemos o seguinte
fato: Certa mulher mantinha relações ilícitas com dois senhores. Aconteceu que
os ciúmes levaram um deles a matar seu rival. Disso sabendo, veio a pecadora
confessar-se, profundamente assustada, e revelou que o assassinado lhe aparecera
carregado de correntes, negro e rodeado de chamas, tendo na mão uma espada.
Brandindo-a, tentara matá-la e ela horrorizada lhe perguntara: Por que me queres
matar? Que te fiz eu? Cheio de cólera, lhe respondera o condenado: Como? Ainda
mo perguntas, mulher criminosa? Es a culpada de ter eu perdido a Deus e o
paraíso! A infeliz invocou então o nome de Maria e a horrível figura
desapareceu.
Oração
Ó Mãe misericordiosa, sois tão clemente e
tendes imenso desejo de proteger os miseráveis e atender-lhes os pedidos! Venho,
por isso, a vós neste dia, eu que sou o mais indigno de todos os homens e
imploro vosso auxílio. Atendei aos meus rogos! Peçam-vos outros, se quiserem,
saúde do corpo, prosperidade e grandeza 'da terra. Quanto a mim, venho
pedir-vos, Senhora, justamente aquilo que desejais de mim, aquilo que é mais
conforme e mais grato ao vosso Santíssimo Coração. Sois tão humilde,
impetrai-me, pois, a humildade e o amor dos desprezos. Fostes tão paciente nos
trabalhos desta vida, impetrai-me a paciência na adversidade; fostes tão cheia
de amor de Deus, impetrai-me o dom do santo e puro amor; fostes toda a caridade
para com o próximo, impetrai-me a caridade para com todos, particularmente para
com o inimigo; fostes totalmente unida á divina vontade, impetrai-me a total
conformidade a todas as disposições de Deus a meu respeito. Sois, em suma, a
mais santa de todas as criaturas, ó Maria, tornai-me santo. Amor não vos falta;
podeis tudo e que reis alcançar-me todas as graças. A única coisa que me pode
impedir de receber vossos favores é, ou a negligência em recorrer a vós, ou a
falta de confiança em vossa intercessão. Impetrai-me, pois, vós mesma a
constância em invocar-vos e a confiança em vosso poder. De vós espero essas duas
graças supremas; de vós as imploro e conto recebê-las confiadamente, ó Maria,
minha Mãe, minha esperança, meu amor, minha vida, meu refúgio, minha força e
minha consolação. Amém.
(Glórias de Maria – Santo Afonso Maria de
Ligório)
Fonte: VAS HONORABILE
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