IMACULADA CONCEIÇÃO

Em 8 de dezembro de 1854, na bula Ineffabilis Deus, o Beato Papa Pio IX proclamava que:

"A doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante de sua conceição, por singular graça e privilégio do Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha da culpa original, é revelada por Deus e por isso deve ser crida firme e constantemente por todos os fiéis." [1]

Celebrar a Solenidade da Imaculada Conceição da Bem-Aventurada Virgem Maria significa, pois:primeiro, que ela foi "preservada imune de toda mancha da culpa original"; segundo, que isto foi feito "em vista dos méritos de Jesus Cristo", ou seja, mesmo acontecendo antes da Redenção, foi Jesus mesmo quem salvou a Sua mãe [2]; terceiro, que esta verdade "é revelada por Deus" – ou seja, não se trata de uma argumentação humana ou de um raciocínio teológico, mas faz parte do depósito de fé e "deve ser crida (...) por todos os fiéis".

Todavia, o que foi colocado de forma negativa pelo Papa Pio IX – que Maria foi privada do pecado – também pode ser meditado de forma positiva. Isto significa dizer que Maria Santíssima tinha a plenitude da graça. Quando o Anjo Gabriel visita Nossa Senhora, ele fica maravilhado em ver nessa terra um "pedaço do Céu", um coração mais santo e agraciado que o seu. Por isso, saúda Maria como nenhum anjo jamais tinha saudado um ser humano: "Χαῖρε, κεχαριτωμένη, ὁ Κύριος μετὰ σοῦ – Alegra-te, cheia de graça! O Senhor está contigo" [3]; e depois: "Μὴ φοβοῦ, Μαριάμ· εὗρες γὰρ χάριν παρὰ τῷ Θεῷ – Não tenhas medo, Maria! Encontraste graça junto a Deus" [4].

Por que o Anjo usa tais palavras para referir-se à Virgem? Para medir devidamente as suas palavras, é importante entender o que é a graça. No Batismo, o cristão recebe a chamada graça santificanteou habitual: com isso, ganha a amizade de Deus, a inabitação trinitária e os dons e as virtudes infusas. Essa realidade, no entanto, é sobrenatural – está acima da natureza. Isso significa dizer que todas as criaturas – minerais, vegetais, animais, humanas ou angélicas –, juntas, valem menos do que a graça na alma de um bebê que acaba de ser batizado. São palavras de Santo Tomás de Aquino: "Sed bonum gratiae unius maius est quam bonum naturae totius universi – O bem da graça é, para o indivíduo, melhor que o da natureza de todo o universo" [5].

Os mártires são o exemplo luminoso de que, de fato, é preferível perder o universo inteiro – a própria vida, a própria saúde, a própria família e os próprios bens – a perder a graça divina. "O Reino dos Céus é como um tesouro escondido no campo. Alguém o encontra, deixa-o lá bem escondido e, cheio de alegria, vai vender todos os seus bens e compra aquele campo" [6]. A graça é verdadeiramente este "tesouro escondido no campo", pelo qual vale a pena "vender todos os seus bens".

Na Virgem Maria, essa graça – que, pequena e incipiente, já é maior que todas as realidades naturais – atingiu a sua plenitude, de modo que os próprios anjos se admiraram de sua santidade:Ave, cheia de graça. Ao contrário, Satanás e as hordas diabólicas tremem diante dessas palavras. Elas recordam que em uma criatura feita do barro habita uma graça muito maior que a que eles rejeitaram. Por isso, Maria Santíssima é realmente o terror dos demônios.

Hoje, como uma criança a contemplar a beleza de sua mãe, o coração da Igreja se alarga para cantar a beleza de Nossa Senhora. Certamente, a Mãe de Deus tinha a sua beleza natural, certamente era mais graciosa que todas as mulheres e mais majestosa que todas as rainhas. Sua maior beleza, todavia, estava no seu ilimitado amor a Deus, na plenitude de graça que Ele lhe concedeu.

No desejo de imitar o amor e a generosidade dessa santa e boa mãe, peçamos a ela: "Mãe, ensinai-me também a corresponder à amizade de Deus e que eu, de hoje em diante, faça o propósito de antes morrer do que pecar, antes derramar o meu sangue do que perder a graça de Deus. Amém."

 

Referências
  1. Bula "Ineffabilis Deus", 8 dez. 1854: DS 2803
  2. "Na época de Duns Escoto a maior parte dos teólogos fazia uma objeção, que parecia insuperável, à doutrina segundo a qual Maria Santíssima foi preservada do pecado original desde o primeiro momento da sua concepção: de fato, a universalidade da Redenção realizada por Cristo, à primeira vista, podia parecer comprometida por semelhante afirmação, como se Maria não tivesse precisado de Cristo e da sua redenção. Por isso os teólogos opunham-se a estes textos. Então, Duns Escoto, para fazer compreender esta preservação do pecado original, desenvolveu um tema que depois seria adotado também pelo beato Papa Pio IX em 1854, quando definiu solenemente o dogma da Imaculada Conceição de Maria. E este argumento é o da 'Redenção preventiva', segundo a qual a Imaculada Conceição representa a obra-prima da Redenção realizada por Cristo, porque precisamente o poder do seu amor e da sua mediação obteve que a Mãe fosse preservada do pecado original. Por conseguinte Maria é totalmente remida por Cristo, mas já antes da concepção." (Papa Bento XVI, Audiência Geral, 7 de julho de 2010)
  3. Lc 1, 28
  4. Lc 1, 30
  5. Suma Teológica, I-II, q. 113, a. 9
  6. Mt 13, 44

Fonte: Christo Nihil Praeponere

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