PARA A QUARESMA: - Parte II
Leia esta importantíssima reflexão sobre a Crucifixão de Nosso Senhor
Rev. Pe. Adolphe Tanquerey
Continuação do post: Para a Quaresma: - Parte I
Entretanto, as trevas foram estendendo e envolvendo, como uma mortalha, a cidade de Jerusalém, a Judeia, o mundo inteiro (Mt 27, 45).
Jesus quis permitir que as trevas invadissem também a sua santa alma; e, para que tudo fosse consumado, sofreu sobre a cruz uma nova agonia.
Depois de a ter vivenciado longamente, um grito de angústia escapa de seus lábios e mais ainda de seu coração: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?” (Mt 27, 46). Palavras misteriosas, mas que muito nos dizem sobre as angustias do Salvador!
Carregado com o peso de nossas iniquidades, de todos os crimes cometidos ou que ainda seriam cometidos sobre a terra, desde o assassinato de Abel até os últimos pecados que precederão o julgamento, tornado para nós e por nós “maldição, execração”, segundo a enérgica expressão de São Paulo (Gl 3, 13), parece-lhe que Deus o abandona, que se retira dele para entregá-lo à justiça.
Que angústia dilacerante para Aquele que , sendo a santidade em pessoa, tem horror infinito ao pecado!
Ele entrevê também os milhões de pessoas, membros de seu corpo místico, que não tirarão proveito dos frutos da redenção, e, diante desta visão, queixa-se dolorosamente: “Meu Deus, por que me abandonais?”.
A sede de Almas
E talvez seja isto que explique este novo brado desolador: “Tenho sede” (Jo 19, 28 – 29).
Sem dúvida, a sede era uma das mais pavorosas torturas da crucifixão; mas o Salvador sobretudo tinha sede de almas: por elas ele sofrera tanto, desde o primeiro instante de sua encarnação!
Ele desejaria salvar todas, santificar todas, apresentar todas elas a seu Pai; e essa sede de almas era para ele muito mais cruciante do que aquela que ressecava a sua língua.
Almas cristãs que contemplais Jesus na cruz, não esqueçais este grito de angústia! O Salvador vos ama tanto que não quer renunciar a vós: se maior desejo, sua sede insaciável é de vos santificar, de vos tornar puras, nobres santas, dignas dele.
E, para isso, espera somente a vossa cooperação; ele mereceu para vós todas as graças que vos são necessárias para atingir um alto grau de santificação.
Iremos nós, por nossas resistências, nossas covardias e inconstâncias, frustrar suas esperanças e tornar inúteis, ao menos em parte, as torturas que ele suportou por amor a nós?
Ele tem sede do nosso amor, do nosso coração. Iremos nós regatear com ele, não respondendo senão com parcimônia ao seu desejo ardente de ser amado por nós?
Pensai nisto: do alto da cruz, o Redentor tudo previu, as nossas covardias, as nossas ingratidões, e isso feriu profundamente o seu coração amoroso.
Mas ele viu também os atos de compaixão, de reconhecimento e de amor, e essa visão o reconfortou; ela temperou essa sede ardente que ele tinha de vossa santificação, e suavizou singularmente os seus últimos momentos. Para o Salvador, com efeito, uma doce consolação sucede à angústia.
Ele vê, ele abarca com o olhar as legiões de mártires, de virgens, de apóstolos, de pais e mães de família, de almas generosas de todas as condições, que, atraídas pela cruz, oferecem-se como vítimas para completar em seu corpo e em sua alma em seu corpo e em sua alma a Paixão que ele sofreu como cabeça do corpo místico.
Essa visão lhe mostra que, para muitos, ao menos, seus sofrimentos não foram inúteis.
Ele se rejubila com isso, e do fundo do seu coração brotam as palavras: “Tudo está consumado!” (Jo 19, 30); sim, tudo, minha Paixão, minha vida, minha obra; meu Pai foi glorificado, e as almas que desejarem serão salvas.
Esse foi o seu adeus à terra. Voltando-se então para o Céu, ele lança um grande grito: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito!” (Lc 23, 46). Palavra de confiança e de abandono, palavra de amor filial, que muitos discípulos irão repetir antes de deixar esta terra para lançar-se nos braços do Pai celeste.
Continua…
Fonte: retirado do livro “A Divinização do Sofrimento” do Rev. Pe. Adolphe Tanquerey.