AS DORES DE NOSSA SENHORA–PERDA E O REENCONTRO DO MENINO JESUS
Terceira Ferida – Perda e o reencontro do Menino Jesus
Os três dias de ausência do Divino Menino foram a terceira ferida de Maria.
Um dos gumes da Espada feriu a alma de Jesus, quando Ele se escondia de Sua Mãe e de Seu pai adotivo para Lhes lembrar, como Ele disse, que se devia ocupar das coisas de Seu Pai.
Mas se é certo que o Céu também pode jogar às escondidas, o outro gume da espada era, para Maria, a dor de ter perdido Seu Filho e procura-lo.
Era Seu – e por isso que Ela O procurava. Ele ocupava-Se da Redenção, e é por isso que Ele A deixava, e ia ao Templo. Não ia nisso apenas uma perda física, mas também uma provação espiritual.
“Ficou o Menino Jesus em Jerusalém sem que Seus Pais O advertissem” (São Lucas 2,43)
Nosso Senhor disse:
“Para que me buscáveis? Não sabíeis que devo ocupar-me nas coisas de meu Pai? E eles não entenderam o que lhes disse” (São Lucas 2, 49-50).
Mas tarde um outro período de três dias se devia registrar, durante o qual o Corpo de Jesus repousaria num túmulo. Esta primeira perda era um prelúdio da segunda, como que a sombra dos três anos de separação que foram a Sua vida pública – em relação à Virgem.
Alguma coisa era agora oculta a Maria, no sentido de que a não compreendia. Não se tratava de uma simples ignorância negativa, mas de uma privação, um propósito deliberado de Seu Filho em Lhe ocultar a plenitude dos Seus desejos.
No Egito, teve Ela “a sombria noite” do corpo; era preciso que tivesse a “sombria noite” da alma, em Jerusalém. A noite espiritual e a desolação da alma andaram sempre juntas nas provações enviadas por Deus aos místicos.
A princípio, é o Seu corpo e o Seu sangue que são ocultos a Maria; agora é a Luz e a Verdade. Se a segunda ferida faz d’Ela a companheira de todos os refugiados errando pelas entradas do Mundo, esta terceira ferida iria levantá-La À companhia dos santos.
A sombra da Cruz começava a projetar-se na Sua alma! Não é apenas o Seu Corpo virginal que devia pagar caro o privilégio da Sua Imaculada Conceição; também a Sua alma sofreria para vir a ser a “Sede da Sabedoria”.
A espada de dois gumes atinge as duas almas, no doce bater de um mesmo ritmo. Certo dia, no Gólgota, chamando Cristo a Si os pecados dos homens, sentirá o pessimismo do ateu, o desespero do pecador, a solidão do egoísta, e reunirá todas as dores do isolamento, num grande grito:
“Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?”
"Meu Deus, porque me abandonaste?"
Também Maria deve experimentar essa solidão e abandono – não apenas na perda física de Cristo, mas ainda na obnubilação de todas as consolações.
Assim como, na Cruz, Ele privará a Sua natureza humana de toda a alegria que Lhe podia vir da Sua divindade, assim também privará Sua Mãe de todas as alegrias relativas às coisas de Seu Pai. Se o gume da espada, reservado a Cristo, era o abandono, o d’Ela era a noite. Diz o Evangelho que caiu a noite sobre a Terra, quando Ele, na Cruz, ergueu às alturas o Seu grito supremo; agora, é a noite que invade o espírito de Maria, porque o Seu Próprio Filho quis esse eclipse do Sol.
É quase uma pergunta que Ele Lhe faz, ao dizer-Lhe:
“Por que me buscáveis?” (São Lucas, 2,49).
Suspenso, mais tarde, na Cruz, entre a Terra e o Céu, devia Jesus sentir-Se abandonado por Deus e repelido pelos homens. Assim, Maria, por uma só palavra da Divina Espada, é abandonada por Aquele que é, ao mesmo tempo, Deus e Homem.
A sombria noite dos santos não é igual à noite dos pecadores. Nos primeiros, não há luz, mas há amor. É muito provável que essa noite mística, que a espada fazia então entrar na alma de Maria, desse lugar, n’Ela, a atos de tal modo heroicos de amor que eles A elevaram a novos tabores, nunca anteriormente entre vistos. Pode a luz ser, por vezes, tão brilhante que nos cegue.
A incompreensão de Maria, ouvindo a palavra de Jesus, era menos devida a uma falta de clareza do que a um excesso de luz.
A razão humana, chegada a certo ponto, nem sempre pode descrever o que se passa no coração. O próprio amor humano, nos seus mais altos momentos de êxtase, não se pode exprimir com palavras. A razão pode compreender palavras, mas não o Verbo.
Ora, diz-nos o Evangelho que aquilo que Maria não compreendia era o que dizia o Verbo. Como é difícil de compreender a palavra, quando ela se divide em palavras! Maria não compreendia porque é que o Verbo A elevava acima do abismo da razão e A arrastava por sobre esse outro abismo incomensurável que é o Espírito de Deus.
A uma tal distância, a Sabedoria Divina, na sua expressão humana, pode dizer o Seu segredo, do mesmo modo que São Paulo não podia contar a sua visão do terceiro Céu. As palavras eram incapazes de exprimir inteiramente, por si, a significação do Verbo.
Para provar que essa noite não era de ignorância, acrescenta o Evangelho:
“E Sua Mãe conservava todas estas coisas no Seu coração” (São Lucas, 2, 51).
A Sua alma guardaria a Palavra, e o Seu coração as palavras.
Ele que, por Suas palavras, parecia renegá-La, une-A, agora, a Si Próprio, não apenas por ter depositado o mel da Sua mensagem na colmeia do Coração d’Ela, mas também porque volta a Nazaré com Ela, submetendo-se-Lhe.
Cristo não se serve de instrumentos humanos, como Simeão ou Herodes, para brandir a Espada Divina sobre Sua Mãe. Aos doze anos, tem força bastante para a utilizar Ele mesmo.
Nessa dor, ambas as Naturezas d’Ele se fixam sobre Ela para fazer d’Ela a co-Redentora: a Sua natureza humana na perda física, a Sua natureza divina na noite sombria da alma.
Na Anunciação, Ela perguntara ao Anjo:
Na Anunciação, Ela perguntara ao Anjo:
“Como pode isso ser, se não conheço varão?”
Hoje, dirige-Se ao Próprio Homem-Deus, chamando-Lhe “Filho” e pedindo-Lhe que Se explique, que justifique o que fez. Maria tem consciência de ser Mãe de Deus. Onde quer que haja santidade há familiaridade com Deus.
E essa familiaridade é maior ainda na dor do que na alegria.
Certos, santos, favorecidos com revelações de Nosso Senhor, declaravam que essa dor de Maria custou a Jesus extraordinários sofrimentos. Ali, como sempre, trespassou Ele, o Seu Próprio coração, antes de trespassar o de Sua Mãe, como o propósito de ser o primeiro a conhecer essa provação.
A dor, que mais tarde iria sofrer, de abandonar Sua Mãe, depois das três horas de agonia na Cruz, era então antecipada por esses três dias de separação.
Aqueles que pecam sem fé não podem sentir a angústia dos que pecam com fé.
Imagem de Nossa Senhora das Dores
Possuir a Deus, ocultar-Se daqueles que estavam no propósito de jamais abandona-Lo, tal foi a ferida de Jesus,
causada pela mesma espada.
Ambos sentiram os efeitos do pecado, de maneira diferente, mas em igual noite de alma: ela por O ter perdido; Ele por se ter perdido. Se a dor de Maria foi um inferno, a agonia de Lha infligir era a dor de Jesus.
A Santíssima Virgem tornou-se o Refúgio dos pecadores por ter aprendido o que é perder Deus e tornar a encontrá-Lo.
Cristo tornou-se o Redentor dos pecadores por ter conhecido a malícia, a vontade deliberada daqueles que ferem os seres a quem amam! Sentiu o que pode sentir a criatura, ao perder a criatura.
Maria perdeu Jesus na noite mística da alma, e não na noite moral de um mau coração. A Sua perda era a ocultação da face d’Ele.
Ela não Lhe fugia.
Ela não Lhe fugia.
Mas mostra-nos Ela que, quando perdemos a Deus, não devemos limitar-nos a esperar que Ele volte. Devemos ir procura-Lo, e é Ela que, para alegria da nossa alma, sabe onde O podemos encontrar!
(O Primeiro amor do Mundo – Arcebispo Fulton J.Sheen)
As Dores de Nossa Senhora:
Fonte: Associação Devotos de Fátima