O ESPÍRITO SANTO, presença divina em nós
CARDEAL D. EUSÉBIO OSCAR SCHEI Arcebispo da Arquidiocese do Rio de Janeiro
Esta semana, vamos refletir sobre o Espírito Santo, com a audácia da intimidade, quase que familiar, daqueles que receberam a filiação divina e reconhecem a ação permanente da Terceira Pessoa trinitária nas suas vidas.
Foi Jesus quem nos revelou o Espírito Santo, isto é, tirou o véu que O encobria, nas alusões da Antiga Aliança, desde o momento da Criação. Jesus deixou esta revelação para a última Ceia, durante o encontro definitivo com os Apóstolos, sob a forma de uma promessa, (cf. Jo 14,16-17.26 ; 15,26 ; 16,7-15), que seria confirmada após a glória da Ressurreição (cf. Jo 20,22-23), e cumprida em Pentecostes (cf. At 2,1-13).
Quando nos fala do divino Espírito Santo, Jesus no-lo apresenta como nosso advogado (Paráclito), palavra grega que significa “Aquele que assenta ao lado”; em latim, o termo é Assistere. O Espírito Santo é o assistente, que nos orienta e nos anima ao fiel cumprimento da vontade do Pai. Fazendo uma analogia, poderíamos dizer que Ele age como “bússola”, instrumento de orientação para os navegantes, indicando o rumo, o norte. Daí o verbo “nortear”, que define a influência do Espírito Santo em nós, para atinarmos com o sentido da nossa vida, do nosso trabalho, e da nossa missão.
O Espírito Santo atuou sobre os que foram incumbidos por Deus de missões especiais junto a Israel, como os patriarcas, juízes e profetas. Fecundou Maria, na Encarnação do Verbo, como Amor eterno, e inspirou a vocação dos apóstolos e discípulos de Jesus. Enfim, agiu, de maneira toda particular, sobre os hagiógrafos, isto é, os escritores dos textos bíblicos, de modo que eles registrassem as verdades da fé, para as futuras gerações.
Da mesma forma, suscitou os Santos Padres, nos primeiros séculos da Igreja. Eles se tornaram a “ponte” entre a Sagrada Escritura e a evolução da Teologia Sistemática posterior. Esta é a ciência da fé, baseada sempre na Sagrada Escritura, vivenciada pela Tradição, e fielmente guardada pelo Magistério eclesial.
A imagem mais perfeita que os Santos Padres nos dão do Espírito Santo é a do Artista, para o qual o autor é como um instrumento, apto a executar as suas inspirações. Pensemos, por exemplo, na harpa, da qual gosto muito. Ela pode até vibrar, ao som de outros instrumentos, mas é, em si, muda. Quem a dedilha, criando toda aquela beleza de melodias, que ultrapassam a inteligência humana, é o Artista, o próprio Espírito Santo. Esta é uma das maneiras de nós entendermos a sua ação, também em nós.
Podemos encontrar uma profunda reflexão sobre a Trindade, na trilogia de encíclicas escritas pelo Papa João Paulo II, e que são, praticamente, a base do seu magistério. A primeira, Redemptor Hominis (1979), dedicada a Jesus Cristo, Redentor do homem, centro do cosmos e da história; a segunda, Dives in Misericordia (1980), sobre Deus-Pai rico em misericórdia; e a terceira, Dominum et Vivificantem (1986), sobre o Espírito Santo na vida da Igreja e do mundo.
Neste último texto, é interessante notar que o Papa fala de uma renovação da vida interior, um novo ardor. Segundo os Atos dos Apóstolos, o Espírito Santo veio, sobre a comunidade reunida, como chamas de fogo, que pairavam sobre eles e os penetravam (cf. At 2,3). Os discípulos de Emaús somente reconheceram Jesus pela Palavra, que lhes abrasou o coração, e pelo partir do Pão (cf. Lc 24,30-32). Portanto, este ardor é a renovada alegria da intimidade com Deus, que estimula a prosseguirmos no anúncio da Boa Nova.
Como ensina o Papa João Paulo II: “Em muitas pessoas e em muitas comunidades amadurece a consciência de que, mesmo com todo o progresso vertiginoso da civilização técnico-científica e não obstante as reais conquistas e as metas alcançadas, o homem está ameaçado, a humanidade está ameaçada. Diante deste perigo, e mais ainda ao experimentar a inquietude perante uma real decadência espiritual do homem, pessoas individualmente e comunidades inteiras, como que guiados por um sentido interior da fé, buscam a força capaz de erguer de novo o homem, de o salvar de si mesmo, dos seus próprios erros e das ilusões que tornam nocivas, muitas vezes, as suas próprias conquistas. E assim descobrem a oração, na qual se manifesta o ‘Espírito que vem em auxílio da nossa fraqueza’. Deste modo, os tempos em que vivemos aproximam do Espírito Santo muitas pessoas, que retornam à oração” (DeV n°65).
O intelecto humano é aberto à verdade, assim como a vontade apetece o bem. Entretanto, captamos as coisas de forma limitada, e o heroísmo de nossos ideais esbarra na fraqueza de nossas iniciativas. O Espírito Santo vem em nosso auxílio, como dynamis, força, para nos alentar, iluminando o intelecto e reforçando a vontade enfraquecida, após o pecado das origens.
Todo ânimo inovador, audácia espiritual ou entusiasmo juvenil devemos à ação do Espírito Santo, bem íntima a nós e, ao mesmo tempo, presente na Igreja. É Ele que nos incita à inovação nos métodos de apresentar o Evangelho como, por exemplo, o emprego frutuoso dos meios de comunicação social. Inspira-nos expressões novas, uma linguagem apropriada, em estilo atual, que transmita, ao mais variados grupos humanos, a autêntica mensagem da Salvação universal em Cristo.
O Espírito de Amor é que harmoniza as nossas comunidades. As divisões, decorrentes das barreiras na comunicação, simbolizadas no episódio da torre de Babel (cf. Gn 11,1-9), são sanadas pelo Dom da Unidade, próprio de Pentecostes. Mesmo que desdobrada em inumeráveis idiomas, a linguagem do Amor é universal, e a única apta a penetrar os corações.
Uma analogia que expressa, claramente, a unidade é a do Corpo da Igreja, no qual cada membro exerce a sua função, dentro do contexto de um organismo operante. O corpo humano, segundo São Paulo, é o grande exemplo. Nossos órgãos e membros funcionam numa complementaridade harmoniosa, dentro do conjunto (cf. 1Cor 12,4-30). Quem aciona esta “engrenagem” perfeita é o divino Espírito Santo.
Peçamos, sempre, ao Pai e a Jesus Cristo, o Espírito Santo. Não precisamos de fórmulas. A melhor maneira de fazê-lo é nos apresentarmos de mãos vazias, reconhecendo nossa carência e incapacidade de nos preenchermos dos bens eternos. Deus, certamente, não deixará de nos atender, pois se nós, sendo maus, sabemos dar boas coisas a nossos filhos, quanto mais o nosso Pai celestial dará o Espírito Santo aos que lho pedirem (cf. Lc 11,13).
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